segunda-feira, março 13, 2006

Óscares 2006 - Duas perspectivas

O liberalismo de Hollywood

Por detrás de um grande filme está uma grande banda sonora. Cada vez defendo mais esta teoria e que Gustavo Santaolalla permaneça no activo por muitos e melódicos anos para poder assiná-la por baixo com a sua música fascinante.
Depois de de Amor Cão, 21 gramas ou Diários de Che Guevara, este argentino de 54 anos vê finalmente reconhecido o seu trabalho em Hollywood ao receber o óscar de melhor banda sonora pelo seu trabalho adoravelmente repetitivo em Brokeback Mountain.
A 78ª edição da entrega dos Óscares de Hollywood ofereceu, ao contrário do que muitos apregoam, várias surpresas: Desde logo, o aclamado Brokeback Mountain venceu apenas 3 dos 8 óscares para que foi nomeado. Depois porque, desses 3, apenas o de melhor realizador teve o impacto oscarizado que a obra poética de Ang Lee fazia antever.
Por fim, porque o prémio de melhor filme foi entregue a Crash, a obra-prima de Paul Haggis (Produtor de Million Dollar Baby) que conta a história dramática do quotidiano de Los Angeles, onde o racismo e a intolerância como resultado da diversidade étnica e racial característica da cidade dos anjos constituem o prato forte.
No entanto, o evento que mais me surpreendeu na noite de domingo passado diz respeito ao vinho que rega Crash.
Transpondo o espírito do novo-rico para o novo-amigo, a academia de Hollywood aprimorou a sua faceta liberal e resolveu aderir ao comboio do hip-hop, premiando “It`s hard out there for a pimp”, do filme Hustle and Flow, com a estatueta referente à melhor música original.
Ora se compararmos esta cerveja sem álcool ao vinho do Porto servido por Bird York no seu “In the Deep”, é forçoso reconhecer o ridículo que as gargalhadas (ingloriamente combatidas) do apresentador Jon Stewart (nota máxima na sua estreia) anunciaram após a entrega do dito prémio.
No fim da festa importa reconhecer que o ano cinematográfico de 2005 foi de enorme qualidade, prevalecendo a vitória do filme-mensagem sobre as grandes produções de Hollywood.
Apologia do respeito pelas diferenças sexuais, religiosas ou raciais; respeito pela liberdade de expressão ou o desmascarar dos efeitos colaterais necessários à sobrevivência do monstro capitalista; vários foram os filmes político-sociais premiados na edição 2006 dos óscares. Perdão, Óscares.

R.C.


“And the Oscar goes to…”

Foi da boca de Jack Nicholson que saíram as palavras que causaram a surpresa da noite. O melhor filme do ano acabou por ser, contra todas as expectativas, o drama alucinante de Paul Haggis.
Que me perdoem aqueles que apostavam nos “cowboys” de Ang Lee para ganhar a estatueta, mas “Crash” é um justo vencedor. Esta produção alternativa que nos remete para o mais profundo, conflituoso e paradoxal interior do ser-humano é, sem dúvidas, a escolha certa da Academia. “Crash” é um filme genial que mistura histórias complexas ao estilo de “21 Gramas” com a profundidade sentimental de “Million Dollar Baby” (a este aspecto não é alheio o facto de Paul Haggis, realizador do filme vencedor deste ano, ter sido o produtor do filme de Clint Eastwood).
Mas algo está a mudar no cinema e as nomeações para melhor filme foram a prova desse facto. Os “blockbusters” aprontam-se a deixar cada vez mais espaço para as produções alternativas como “Crash” e “Good Night and Good Luck”.
Saem como grandes vencedores da noite dos Óscares, não só “Crash" e Philip Seymour Hoffman (dono de uma das mais desconcertantes interpretações que o cinema já conheceu), mas também o cinema em si. A qualidade melhora a olhos vistos e esperemos que continue assim, em prol do cinema e em prol de uma melhor consciência crítica.

P.R.