terça-feira, maio 24, 2005

1984, George Orwell

George Orwell foi capaz de prever uma sociedade que um dia mais tarde viria a ser vítima de uma imensa repressão a nível de sentimentos, acções mais íntimas e primitivas. Nesta sociedade, o que interessava era somente o poder e tudo o que fosse necessário para conseguir ou atingir um certo objectivo era sacrificado com grau nulo de piedade. Aqui, vivia-se num verdadeiro poço onde o prazer, ou mesmo as necessidades do ser humano não se concretizavam. Um poço no qual a liberdade de expressão, a convivência eram apenas gotas de água que se evaporavam com o calor de tanta crueldade. Até mesmo o sexo, era apenas encarado como meio de reprodução.
Sintetizando, Orwell previu uma sociedade incapaz de usar os seus valores.

Em 1984, na descrição do quotidiano dos cidadãos, notava-se que viviam de uma forma muito condicionada. Viviam sobre a alçada do medo. Ao reflectir sobre certos pontos e tendo em conta algumas “ideias” de Luigi Giussani, não sei se estarei errado, mas concluí que a maneira de governar dos partidos não possibilitava o Homem de questionar-se sobre algumas questões existencialistas. Questões essas que não podem ser colocadas de parte no caminho que percorremos, mais concretamente, a nossa vida. A vida é impossível de descrever, e “quem sou eu?”, também o é. Mas o Homem desde sempre foi dotado de consciência e é ela que fá-lo ver o que muitas vezes está certo ou errado. E isto porquê?
Porque o Homem ao sofrer tais repressões vindas de uma entidade desconhecida e ameaçadora, automaticamente entrou em estado de alienação. O “eu” deixou de ser questionado, logo a procura de respostas a estas perguntas interiores foram por assim dizer exterminadas. Winston Smith, o protagonista e todos aqueles que sofreram lavagens cerebrais e “fuzilamentos”são o grupo dos “la resistence”.
Para Winston, os valores vieram ao de cima e este não sendo capaz de fechar as portas aos sentimentos, uns de carácter existencialista, outros de carácter mais banal foi vítima das circunstâncias.
O Homem nunca está satisfeito com aquilo que tem. Uns aceitaram esta forma de vida, não sendo grande parte das vezes, justos para com eles próprios. Outros não. Como diz o ditado, o fruto proibido é o mais apetecido e Winston aparece como aquele que mais o deseja. Em suma, ele apenas tentava ser justo com a sua própria consciência, com o seu eu. Ele é o símbolo da rebeldia, daquele que desafia as leis impostas pelo poder político e as dos sentimentos, mas fundamentalmente mostra uma vontade imensa de não perder o significado do que é viver, de não anular a sua personalidade em detrimento de ideologias absurdas.

No fundo, George Orwell através desta sua magnífica obra proclama por uma democracia, em “Que sempre que qualquer forma de Governo se torne contrária a esses fins (vida, liberdade e a procura da felicidade), tem o Povo o direito de a alterar ou abolir, e de instituir novo Governo…”. Se Winston tivesse tido a oportunidade de alterar alguma coisa, concerteza que teria usado o ponto 1 do Artigo 37º (Liberdade de expressão e informação) da Constituição da República Portuguesa para se pronunciar contra estas barbaridades. Assim, para ele, todos teriam o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, acrescentando ainda, a nunca ficar estático ou calado em relação algo que lhe impedisse de aceder à verdadeira felicidade.
Se sabemos que estas formas de governar já existiram, nomeadamente no nosso país com a época do Salazarismo, como é que ainda surgem pessoas que criam ideias com base nestes conceitos? Por exemplo os E.U.A. têm uma “coisa” chamada de Patriot Act. Exemplificando, se comprarmos um livro sobre a religião islâmica automaticamente somos controlados pelo Governo. A verdade é que, nos dias de hoje, nós é que nos submetemos a estas formas de viver. Porquê achar piada a reality shows cujas ideologias deram origem a momentos de sofrimento a milhões de pessoas? Onde está a graça? Basicamente é mais uma prova de que os homens com as mesmas ideologias de Winston lutam e resistem para provar que tudo isso é uma grande mentira. De que quando somos observados 24 horas por dia, a convivência entre as pessoas torna-se um caminho repleto de obstáculos. Deixa de haver intimidade, as discussões surgem e os sentimentos mais profundos nunca vêm ao de cima.
George Orwell escreveu 1984 para explorar o sentido de injustiça, expor uma mentira que ataca como um vírus as grandes sociedades. Nós como cidadãos do Mundo e devemos seguir o que Orwell iniciou na sua obra para que a felicidade, a parcialidade e o surgir de um sentido para a vida sejam conceitos que prevaleçam para sempre.
B.M.

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

"1984"... Uma data passada que remete mais para o presente e o futuro do que para o próprio passado. Grande livro analisado e criticado de uma forma muito inteligente pela tua parte. É pena que a nossa sociedade seja cada vez mais.. assim! Orwell "triunfou" com os porcos e, em 1984, deformou uma sociedade à imagem de que hoje podemos (infelizmente) afirmar ser: a nossa sociedade... Excelente crítica!

12:37 da manhã, maio 25, 2005  
Anonymous Anónimo said...

li e gramei! a tua análise remete-nos para um livro que se vai perdendo no tempo mas que mantem uma total actualidade.É INTELIGENTE!O drama é saber como podemos ser competitivos e humanos,cultos e produtivos,viver democráticamente e amar com serenidade.

4:24 da tarde, maio 25, 2005  
Anonymous Anónimo said...

Heya...Finalmente um comentário meu...
Creio que Orwell antecipou apenas fragmentos do que são as realidades de algumas sociedades contemporâneas. Digo isto porque considero que fazer um paralelismo total e directo, entre a "ficção" e a "realidade actual", é algo abusivo (pelo menos por enquanto).Acredito profundamente que ainda não atingimos o nível dos factos apresentados no livro e que seremos capazes de inverter a corrente dos acontecimentos (serei ingénua?).
Gostei muito da tua análise: bem escrita, inteligente e acima de tudo interessante.

12:14 da tarde, maio 30, 2005  

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