terça-feira, maio 31, 2005

Ignoto

Ainda não descobri as razões que me têm proporcionado esta inconstante viagem, onde os caminhos trilhados por linhas tortas se desviam daquilo que eu considero ser o porto de abrigo, o qual onde eu vou atracar e nunca mais ser arrastado por um náufrago que me levará até areias desconhecidas.
A nossa vida é constituída por um acumular de experiências, de acções realizadas que dão cor a uma história. E eu pensava que já tinha um número de experiências suficientes para dar iníco ao prólogo de um livro. Enganei-me...; esta luta - repleta de páginas soltas, as quais nunca terão uma ordem, - tem sido causa de tanto suor reflectido, de encontros com novas realidades que ainda se apresentam muito desfocadas.
Ando desencontrado... mas para já não me quero encontrar. Quero vaguear um pouco mais por este mundo da dúvida. Aquele que me empurra para valas onde o erro se esconde...
O que é certo é que os dias bons existem e os maus também. Por isso vou encarar, durante mais uma linha recta da minha vida, esta sina inevitável. A meta será alcançada quando sentir que me encontrei e dessa forma, ser capaz de me teletransportar para o reino onde paira um aroma de serenidade. Onde cada passo dado é acompanhado por uma melodia de fundo. Por isso vou procurar encontrar um meio termo, um ponto central onde seja possível sentar-me, olhar para um lado e para o outro e ficar na dúvida qual dos dois escolher. Vou olhar para o horizonte de cada um, deitar-me e sorrir, por achar graça em não saber o que há para lá dessa linha.
O nevoeiro do dia-a-dia dará a provar-me a amargura da vida e o pôr-do-sol a paz de que o meu coração tanto apela.
B.M.

sexta-feira, maio 27, 2005

O sentido

“Contos Exemplares” é uma obra de Sophia de Mellho Breyner Andresen recheada por um conjunto de textos, neste caso, contos que se apresentam carregados de subjectividade e por uma vertente extremamente humanista, que tem a capacidade de dar largas à imaginação do leitor. Toda e qualquer interpretação estará revestida por uma visão única, com perspectivas e entendimentos diferentes de outros.
Apesar de os contos em geral serem acompanhados por uma linha misteriosa, apenas um foi capaz de suscitar em mim o interesse ou mesmo a vontade de reflectir sobre cada parágrafo, frase, palavra e pontuação.
O conto “O Homem” foi o único que ocupou na minha mente um lugar eterno, isto porque remete para um tema que raramente é questionado, o sentido da vida. “O Homem” descreve vários elementos do nosso dia-a-dia, as horas, o movimento cosmopolita, o stress que nos é imposto e o desaparecimento dos poucos minutos que temos para pensar em nós. No meio deste turbilhão citadino, três personagens fazem uma história. Um homem com uma criança ao colo e uma mulher que no meio de um oceano humano pára para observar a decadente imagem do homem e a divina beleza da criança.
É bem visível que em todos os contos a autora tenha tentado colori-los com um guache religioso, mas fê-lo de uma forma tão subtil que nem nos apercebemos das pinceladelas mal dadas.
Com um olhar agora mais virado para o conto, a própria sociedade que nós criámos é anti-natura. Nós conseguimos ter o poder de nos auto-destruir, afastando-nos de questões existencialistas de elevada importância. Os dias correm ao ritmo de uma montanha russa, tal como a velocidade da onda humana referida no conto. O que acontece, é que tornamo-nos cada vez mais em seres anónimos sem capacidade de justificar a razão pela qual existimos. Os nossos cérebros são ocupados de tal maneira que nos levam por vezes a agir irrazoavelmente. Adoptamos o sistema mais simples, que é o de viver como se não existíssemos e de evitarmos os debates “filosóficos” sobre esse mesmo sentido.
Estaria a mulher à procura de algo? Seria o homem das barbas pontiagudas, com aspecto de mendigo, “Deus”? E a criança?
Mas o que realmente procurava aquela mulher? Talvez uma alternativa ao sentido de viver. E será que ela já tinha um caminho definido? Talvez não, isto porque se o tivesse nunca teria abandonado aquele ritmo robótico daquela corrente humana.
A meu ver, hoje em dia somos obrigados a nos afastar de certas formas celestes que nos poderiam dar a conhecer a verdadeira Natureza. Aquela que nunca foi nem nunca será transformada. Onde não existem alternativas porque tudo tem uma razão de ser. Os olhos da mulher fixaram-se numa imagem que lhe proporcionou um verdadeiro bem-estar. Todos os sons, luzes, movimentos que a rodeavam desapareceram e num curto espaço de tempo, as três personagens foram inseridas num círculo harmonioso. Ela, percebeu definitivamente que vive na palma da mão de uma entidade divina e que se for capaz de encarar isso com toda a sua fé, será uma excepção envolta em felicidade no centro de uma mundo tão superficial.
O homem morreu e desapareceu, talvez devido às pessoas não quererem encará-lo como a razão de existirem. A imagem pobre que ele apresentava é o símbolo de abandono daqueles que acreditavam e que hoje, já nem se lembram que um dia acreditaram. A criança, com certeza que simbolizava a beleza para aqueles que tiveram a coragem de acreditar que a vida não é vivida somente à superfície da pele. É também vivida de forma interior.
Ter fé basta viver-mos conscientes de que estamos vivos. Aquela mulher precisava de “Deus” para se sentir viva.
B.M.

quarta-feira, maio 25, 2005

OUI - NON

A Europa encontra-se a um passo de decidir muito do seu futuro. E porquê? Porque a França, dividida entre o sim e o não à Constituição Europeia, galopa a um ritmo infernal por um caminho incerto...

Em primeiro lugar, há que ter em conta a importância da opinião francesa neste referendo. É que este país foi um dos mais importantes fundadores da União Europeia, tendo uma voz que ditou muito daquilo que foi até hoje feito «em nome da Europa». Contribuiu com personalidades de todas as áreas, incluindo um dos símbolos do pensamento actual europeu – Jacques Delors. A “casa” europeia foi construída com “alicerces” franceses e conservada com muitas “paredes” francesas. Desta forma, compreender-se-á que a sua opinião é de extrema importância para todo o povo europeu.

Mas o que se debate hoje em França ultrapassa a própria ideia da «construção europeia». Debate-se desde a integração da Turquia à U.E. à forma como os franceses entendem que Jacques Chirac não tem ouvido o seu povo (facto que incontornavelmente o fez ser quem é), passando pelo recente alargamento da Europa a 25 e por temáticas como o “offshoring” de postos de trabalho e a globalização. Formas diversas de responder a um referendo que se tornou no “bode expiatório” de imensas temáticas que em pouco dizem respeito ao próprio documento da Constituição Europeia.

Valéry Giscard d’Estaing, principal criador do texto da Constituição, defende o documento, afirmando ser esta «a Constituição certa para a Europa». Num artigo para a revista Time, Giscard d’Estaing admite que, até a ele, este texto dá insónias, mas que a melhor maneira do povo francês responder ao referendo é assegurando o sim, «evitando o cenário de pesadelo» que o mesmo pode criar ao ser rejeitado. Por outro lado, Bruno Gaccio, principal argumentista do programa satírico francês “Les Guignols de l’Info”, defende peremptoriamente o não, afirmando: «Esqueça a Constituição. São os líderes políticos franceses que devemos rejeitar». Desta afirmação é fácil retirar os fundamentos do voto no não. O povo francês está farto da forma como a sua classe política age (como elite governamental), não ouvindo a opinião da sociedade em geral. Não obstante o facto de a França realmente já não se sentir no comando das ideias da Europa, o que leva a confirmar uma tendência já há muito defendida por muitas vozes mundiais. Desta forma, é muito provável que o não ganhe; mas mesmo que não ganhe, pelo menos deste poderoso debate em França, os políticos já não mais esquecerão a importância da voz do seu povo. Os argumentos de ambos os lados são diversos, mas uma coisa é verdade: se os franceses rejeitarem o documento da Constituição, as repercussões serão sentidas por toda a Europa... e o futuro desta será incerto.
P.S.: Pessoalmente, defendo um não francês à Constituição Europeia - mesmo discordando de muitos argumentos e opiniões usadas neste campo -, pelo simples facto de esta opinião ir gerar um fortíssimo debate sobre os fundamentos da Europa, assimilando velhas e novas ideias e problematizações que deverão “paralisar” os europeus para reflectirem um pouco sobre o futuro destes «Estados Unidos». A meu ver, um não significaria uma resposta convicta do povo europeu aos “comandantes” da U.E. para idealizarem e concretizarem, de uma forma convicta, um conjunto de “armas de agir” sobre o poderio europeu face às outras potências mundiais. Pois esta é uma altura crucial para a Europa poder fazer frente às mais poderosas economias mundiais; e um simples erro poderá fazer toda a diferença – daí eu defender um debate realmente alargado e consistente que ponha em acção uma ideia única de uma Europa unida e forte.
J.A.

terça-feira, maio 24, 2005

and now for something completely different... the reality

Depois de ter sido apresentado o valor do défice orçamental para 2005, Portugal terá mesmo que “apertar o cinto”!! Mas desta vez terá que ser mesmo apertado por todos, sem excluir as próprias elites governamentais, visto que o défice público calculado até ao fim deste ano é de 9,6 mil milhões de euros, o equivalente a 6,83 por cento do PIB. De facto, este valor, que deixou todo o país manifestamente surpreendido, é exorbitante, sendo quase certo que Portugal será penalizado, pela União Europeia, com um processo por défice excessivo.

Esta é a realidade – Portugal encontra-se numa situação de extrema delicadeza! Todos nós já nos sentimos demasiado “apertados” para abrir os olhos para esta realidade, mas se não o fizermos agora, as consequências desse acto serão incalculavelmente desastrosas. Daí termos que sofrer agora medidas extremamente nocivas para todos nós, mas que ditarão o futuro de Portugal, não obstante o facto de ser um processo que deverá ser conduzido cuidadosamente, de preferência por toda a classe política portuguesa, fugindo a debates internos e partidários.

Em 2001, quando foi anunciada a crise económica em que Portugal se encontrava, na altura pela voz de Durão Barroso, a preocupação era extrema e os cuidados a ter eram muitos. Dessa altura até agora, será um facto dizer que pouco ou nada se fez para mudar a situação do país. Governos sucessivos, cada um com as suas «políticas de ordem imperial», sobrepuseram consecutivamente pequenas matérias àquelas que realmente interessavam e interessam ao país. Não será, a meu ver, necessário explicitar quem é que fez o quê em que altura. Toda a classe política portuguesa é culpada e responsável por não ter respondido prontamente aos problemas que realmente importam ao nosso país. E, desta forma, chegamos a meados de 2005 com um défice orçamental assustador – que deverá realmente assustar-nos a todos, para ver se desta vez a reacção é realmente a união de todo o povo português por uma mesma causa – a nossa “salvação”. Uso a palavra “salvação”, porque, como todos nós sabemos, o poder económico é aquele que «comanda a vida» dos nossos tempos e sociedades, e se não despertarmos agora, mais tarde o resultado será, talvez …quiçá… uma implosão económica parecida à da Argentina há poucos anos.

Neste tipo de matérias lembro-me sempre de um «exemplo espanhol», em que de um governo para outro passam ministros que tutelam pastas demasiado delicadas para serem entregues a um outro dirigente, com uma outra filosofia de trabalho e ideais bem diferentes. Parece que é um facto tremendamente assustador para o povo português manter um ministro numa pasta de um governo para outro (talvez o exemplo de Manuela Ferreira Leite seja dito bem alto, visto termos perdido um cérebro realmente reformista e implacável na pasta das Finanças).
De facto, neste ponto, elogio o povo espanhol e blasfemo o povo português, pela sua fraca visão de um futuro. Pensa-se muito no dia a seguir ao de hoje, em vez de se pensar nesse e nos outros que virão. Pois esta visão é que tornará o nosso país numa nação próspera a nível económico e, consequentemente, a todos os níveis. «São exigidos sacrifícios a curto, médio e longo prazo», escrevia hoje José Manuel Fernandes, em que todos nós temos de cumprir o nosso papel. Pois não é altura para nos dividirmos em partidos e suas opiniões, mas sim juntarmo-nos numa única voz acordada por todos, que faça este país ser uma nação equilibrada e sustentada por alicerces fortes, que não desmoronem nem depois de amanhã, nem daqui a dez anos, mas que sustentem toda uma sociedade que há muito já deveria ter começado a pensar nisso.
J.A.

1984, George Orwell

George Orwell foi capaz de prever uma sociedade que um dia mais tarde viria a ser vítima de uma imensa repressão a nível de sentimentos, acções mais íntimas e primitivas. Nesta sociedade, o que interessava era somente o poder e tudo o que fosse necessário para conseguir ou atingir um certo objectivo era sacrificado com grau nulo de piedade. Aqui, vivia-se num verdadeiro poço onde o prazer, ou mesmo as necessidades do ser humano não se concretizavam. Um poço no qual a liberdade de expressão, a convivência eram apenas gotas de água que se evaporavam com o calor de tanta crueldade. Até mesmo o sexo, era apenas encarado como meio de reprodução.
Sintetizando, Orwell previu uma sociedade incapaz de usar os seus valores.

Em 1984, na descrição do quotidiano dos cidadãos, notava-se que viviam de uma forma muito condicionada. Viviam sobre a alçada do medo. Ao reflectir sobre certos pontos e tendo em conta algumas “ideias” de Luigi Giussani, não sei se estarei errado, mas concluí que a maneira de governar dos partidos não possibilitava o Homem de questionar-se sobre algumas questões existencialistas. Questões essas que não podem ser colocadas de parte no caminho que percorremos, mais concretamente, a nossa vida. A vida é impossível de descrever, e “quem sou eu?”, também o é. Mas o Homem desde sempre foi dotado de consciência e é ela que fá-lo ver o que muitas vezes está certo ou errado. E isto porquê?
Porque o Homem ao sofrer tais repressões vindas de uma entidade desconhecida e ameaçadora, automaticamente entrou em estado de alienação. O “eu” deixou de ser questionado, logo a procura de respostas a estas perguntas interiores foram por assim dizer exterminadas. Winston Smith, o protagonista e todos aqueles que sofreram lavagens cerebrais e “fuzilamentos”são o grupo dos “la resistence”.
Para Winston, os valores vieram ao de cima e este não sendo capaz de fechar as portas aos sentimentos, uns de carácter existencialista, outros de carácter mais banal foi vítima das circunstâncias.
O Homem nunca está satisfeito com aquilo que tem. Uns aceitaram esta forma de vida, não sendo grande parte das vezes, justos para com eles próprios. Outros não. Como diz o ditado, o fruto proibido é o mais apetecido e Winston aparece como aquele que mais o deseja. Em suma, ele apenas tentava ser justo com a sua própria consciência, com o seu eu. Ele é o símbolo da rebeldia, daquele que desafia as leis impostas pelo poder político e as dos sentimentos, mas fundamentalmente mostra uma vontade imensa de não perder o significado do que é viver, de não anular a sua personalidade em detrimento de ideologias absurdas.

No fundo, George Orwell através desta sua magnífica obra proclama por uma democracia, em “Que sempre que qualquer forma de Governo se torne contrária a esses fins (vida, liberdade e a procura da felicidade), tem o Povo o direito de a alterar ou abolir, e de instituir novo Governo…”. Se Winston tivesse tido a oportunidade de alterar alguma coisa, concerteza que teria usado o ponto 1 do Artigo 37º (Liberdade de expressão e informação) da Constituição da República Portuguesa para se pronunciar contra estas barbaridades. Assim, para ele, todos teriam o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, acrescentando ainda, a nunca ficar estático ou calado em relação algo que lhe impedisse de aceder à verdadeira felicidade.
Se sabemos que estas formas de governar já existiram, nomeadamente no nosso país com a época do Salazarismo, como é que ainda surgem pessoas que criam ideias com base nestes conceitos? Por exemplo os E.U.A. têm uma “coisa” chamada de Patriot Act. Exemplificando, se comprarmos um livro sobre a religião islâmica automaticamente somos controlados pelo Governo. A verdade é que, nos dias de hoje, nós é que nos submetemos a estas formas de viver. Porquê achar piada a reality shows cujas ideologias deram origem a momentos de sofrimento a milhões de pessoas? Onde está a graça? Basicamente é mais uma prova de que os homens com as mesmas ideologias de Winston lutam e resistem para provar que tudo isso é uma grande mentira. De que quando somos observados 24 horas por dia, a convivência entre as pessoas torna-se um caminho repleto de obstáculos. Deixa de haver intimidade, as discussões surgem e os sentimentos mais profundos nunca vêm ao de cima.
George Orwell escreveu 1984 para explorar o sentido de injustiça, expor uma mentira que ataca como um vírus as grandes sociedades. Nós como cidadãos do Mundo e devemos seguir o que Orwell iniciou na sua obra para que a felicidade, a parcialidade e o surgir de um sentido para a vida sejam conceitos que prevaleçam para sempre.
B.M.

POEMARMA

A pedido de um grande amigo que quis partilhar este poema de Manuel Alegre com todos aqueles que se interessam pela arte de escrever.

Que o poema tenha rodas motores alavancas
que seja máquina espectáculo cinema.
Que diga à estátua: sai do caminho que atravancas.
Que seja um autocarro em forma de poema.

Que o poema cante no cimo das chaminés
que se levante e faça o pino em cada praça
que diga quem eu sou e quem tu és
que não seja só mais um que passa.

Que o poema esprema a gema do seu tema
e seja apenas um teorema com dois braços.
Que o poema invente um novo estratagema
para escapar a quem lhe segue os passos.

Que o poema corra salte pule
que seja pulga e faça cócegas ao burguês
que o poema se vista subversivo de ganga azul
e vá explicar numa parede alguns porquês.

Que o poema se meta nos anúncios das cidades
que seja seta sinalização radar
que o poema cante em todas as idades
(que lindo!) no presente e no futuro o verbo amar.

Que o poema seja microfone e fale
uma noite destas de repente às três e tal
para que a lua estoire e o sono estale
e a gente acorde finalmente em Portugal.

Que o poema seja encontro onde era despedida.
Que participe. Comunique. E destrua
para sempre a distância entre a arte e a vida.
Que salte do papel para a página da rua.

Que seja experimentado muito mais que experimental
que tenha ideias sim mas também pernas.
E até se partir uma não faz mal:
antes de muletas que de asas eternas.

Que o poema assalte esta desordem ordenada
que chegue ao banco e grite: abaixo a pança!
Que faça ginástica militar aplicada
e não vá como vão todos para França.

Que o poema fique. E que ficando se aplique
a não criar barriga a não usar chinelos.
Que o poema seja um novo Infante Henrique
voltado para dentro. E sem castelos.

Que o poema vista de domingo cada dia
e atire foguetes para dentro do quotidiano.
Que o poema vista a prosa de poesia
ao menos uma vez em cada anos.

Que o poema faça um poeta de cada
funcionário já farto de funcionar.
Ah que de novo acorde no lusíada
a saudade do novo o desejo de achar.

Que o poema diga o que é preciso
que chegue disfarçado ao pé de ti
e aponte a terra que tu pisas e eu piso.
E que o poema diga: o longe é aqui.


in O Canto e as Armas

B.M.

Palavras

... Quero falar contigo debaixo dos lençóis, ter como companhia uma luz-ambiente de tom avermelhado a pintar as paredes do nosso quarto e que ela repouse somente nos contornos de parte do teu rosto, quadro de uma vida que é metade de mim. Quero levar uma cama para a praia e dormir lá contigo. Lá, onde as ondas do mar envolvem a areia como uma mãe abraça um filho ...
Areia, lençóis, abraços, mar, nada. Quero acordar!
Quando acordo sei que as palavras são como a peneira que tapa o sol, líxivia barata que limpa o meio e suja nas pontas. E eu sinto-me sujo de confusão e estou viciado nesta lixívia. Preciso dela como de oxigénio, é o que me mantém a respirar dentro do buraco onde o meu coração caíu ha demasiado tempo, julgando ter alugado um apartamento na condomínio da felicidade.
Sei que os olhos falam mais do que as palavras. Muito mais.
Quero acreditar nisso, quero ser isso. No dia em que o conseguir deixo de escrever estas merdas e dormirei em paz, com o coração tão oco de dor quanto eu sonho que um dia ele fique.
R.C.

sábado, maio 21, 2005

Bunker da alma

Que vida estranha, dever amar mas não poder escolher,
realidade cruel, dever parecer e iludir ser,
estranho mundo, carrossel de vidas que nos ilude, nos transforma,
nos modela a um ritmo alucinante,
quero viver, quero ser eu, ser puro,
ser ingénuo, ser dono e unico inquilino da minha verdade,
construir um Bunker na minha alma onde só entra a minha felicidade,
alimentar o meu ser com a pureza de uma vida que nunca devia ter deixado de o ser,
quero respostas, quero perguntas,
tenho fome de ansiedade e sede de receio,
quero viver, quero viver e que ninguém o tente fazer por mim...

Olho o céu e minh'alma anseia liberdade,
liberdade...esse destino erróneo para o qual não há caminho,
olho á minha volta e a alegria reina,
Oh destino cruel de sentimentos escondidos na ânsia de viver,

A minha paixão é a vida, nobre e humilde,
rica e pobre,
alegre e triste,
A minha paixão és só tu meu triste fado,
dá me alento e ensina me a viver...

P.R.

Sou uma pedra fria

Sou uma pedra fria, cinzenta, chutada para longe por todos.
Sou a erva daninha, verde e odiosa que por todos é pisada e deitada fora quando moribunda.

Ah!Mas há-de quem me chute!
Mas há-de quem me pise!

Eu sou uma fronteira,
Todos me queriam com uma côr, com uma bandeira
Todos me queriam religioso e hipócrita
E afinal tudo o que eu quero é das palavras a magia – a verdade!
Sim, porque a verdade ainda existe...

Sou uma pedra fria, sim.Cada vez mais fria, aliás.
Quero flores vermelhas no meu jardim, pétalas macias caindo na minha face...
Passar naquela rua côr-de-rosa, eu quero
Pisar aquela areia de música,
Molhar os lábios naquela espuma de poesia
Extrair a consciência da demência do dia-a-dia
E disso viver como se de ar azul se tratasse...

E queriam-me obediente e submisso
Calado e sem lágrimas, queriam que eu fosse
Um líder, o maior – um Deus!
Mas eu sou apenas um ser subversivo, insolente
Como todos aqueles que morrem sózinhos...

E quando eu morrer não quero cá lágrimas nem falsos lamentos,
Lancem-me alcoól, injectem-me inconsciência
No sangue que há-de arder nas chamas do inferno...

E eu hei-de gritar como uma fria pedra grita nas frias chamas do paraíso
E que por força do meu fado, que seja por força de minh’alma,
Que a palavra liberdade conste no meu letreiro,
Naquele meu lugar derradeiro...

Ah!Mas há-de quem me chute!
Mas há-de quem me pise!

Que a liberdade será o meu letreiro,
Aconteça o que acontecer, no meu momento derradeiro!!
F.A.R.

Pedaços da minha vida

A tua voz droga-me...
Perco-me nestas horas de cimento-chuva
Vida perdida e já diz o povo,
Muita parra e pouca uva

Leva-me, vento, para bem longe daqui
Onde o mar embala-me num sonho madrugador
Aurora fértil de campos que eu nunca vi
Onde os pássaros cantam o teu nome em meu redor

Sonho em agarrar o ar,
Torná-lo meu amigo, irmão de toda a vida
Chovo paixão até o peito rebentar
Escrevo para ti com a alma nos dedos, minha querida...

As palavras pesam-me, apoiam-se em mim
Rejeitam tudo o que é normal e enfadonho
Prostituta é a minha alma, cheia de peças que respiram no fim
Vendidas ao mundo pelo rasto de um sonho

Do açucar, faço vinagre com matrículas distorcidas
Escondo as sombras que queimam a lua
Congelo o inferno e saro as tuas feridas
Pedaços da minha vida, que é tua...

R.C.

quinta-feira, maio 19, 2005

É?

O que será?

Será?

Sim ou não?

Não?

Sim?

Quiçá!

Depois desta breve introdução permitir-me-ei dizer que Não! Visto que é permitido tal circunstância sem haver qualquer motivo absoluto para tal ocorrência. Daí que tenhamos certas e determinadas instâncias que nos dizem que somos autorizados a tal, contudo vamos ao terreno explorar a situação levada a cabo e constatamos o oposto, será que isto é o real? O que será o real? Saberemos nós? Penso que ninguém sabe efectivamente o que será passível ou não de possibilidade, contudo e não desdenhando penso que estará em certa ordem por descobrir o que pode ou não ser, não obstante dizem que é, mas eu discordo porque na prática não é.

E quem saberá?

Tu?

Eu?

Vocês?

Nós??

Quem sabe se é ou não realmente, é a população em geral, vulgo as pessoas, mas tendo em conta que a maioria das pessoas não sabe o que pensa, ou se sabe o que pensa não se consegue exprimir correctamente, penso que no fundo ninguém saberá se tem possibilidades ou não de existência, mas e se tiver? Quando é que iremos descobrir isso? Amanhã? Depois de amanhã? Daqui a mil anos? E se já foi descoberto e não fazemos a mínima ideia. Hipótese: Um mendigo durante o reinado de Leão XV rei de Inglaterra descobriu a solução para este enigma, contudo não se apercebeu de tal coincidência e guardou para si esse segredo! Estaremos nós condenados a não saber a decifração do enigma? Penso que esta é a única e autêntica verdade que poderemos saber.

Só sei que nada sei” Sócrates.

L.M.

quarta-feira, maio 18, 2005

Viver

Costumo dizer que distingo as pessoas por duas categorias. Por mais limitativo que isto possa parecer (e é), na minha opinião existem aqueles que têm o sim na ponta da língua e depois existem os outros, os que têm o não.
Nem todas as pessoas são iguais. Muitos nasceram e cresceram em berço de ouro, têm capacidades financeiras para ter o que bem lhes apeteça. Outros há que passam por dificuldades e pouco ou nada têm na vida. Eu encontro-me algures alí no meio e sempre procurei viver com o sim na ponta da língua, porque é esse impulso de vida que me faz levantar com vontade de cantar, de cumprimentar os meus amigos com vontade de sorrir, de ser feliz.
Sim.
A vida, dizem Eles, é muito curta. (E)les têm razão, para quê negarmos aquilo que nos pode fazer sorrir, para quê preocuparmo-nos com o que não tem importância, para quê abdicarmos do que sonhamos para agradarmos a quem apenas queria ser como nós?
Andamos aqui neste mundo vestidos de vidro a tentar fugir da morte, fechando-lhe a porta à chave quando ela a qualquer hora acabará por entrar pela janela, sem avisar e levar-nos consigo.
Sejam parvos, sejam tolos e inconvenientes. Sejam crianças, sejam loucos e felizes.

R.C.

Closer

Closer, mais que uma história de vida é uma história de vidas vividas até ao mais profundo da razão humana. Um romance fabuloso que mexe com todos aqueles que têm a coragem de amar outra pessoa. Com desempenhos fabulosos, principalmente de Clive Owen e Natalie Portman, Closer transporta-nos para um universo de relações desastrosas, sonhos falhados, fantasias inverosiméis e acima de tudo: acompanha nos no regresso á monotonia das relações que embora não sejam aquelas que desejamos, são aquelas que nos transmitem maior estabilidade.
Como diria o poeta: "O Amor tem razões que a própria razão desconhece" e ao contrário de muitos outros filmes, Closer não priveligia essa velha máxima e mostra-nos uma realidade tal e qual esta é. Podemos, por exemplo, ver a ganância na personagem de Jude Law que termina sozinho ou o receio, medo de amar e regresso a uma vida estavél na personagem de Julia Roberts.
A própria banda sonora que nos acompanha neste cruel retrato da realidade está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento do filme pois como a letra de The Blowers Daughter realça I can't take my eyes off of you...until i find somebody...
P.R.

Mondovino

De uma forma incrivelmente bem feita, Johnattan Nossiter conseguiu criar um filme onde o mundo do vinho e o da política andam de braço dado.
Um filme que não se traduz somente num documentário como também num espelho que reflecte o poder do mundo ocidental e sua influência na forma de pensar das pessoas. Num estilo muito romancista, Mondovino apresenta-nos os testemunhos daqueles que temem o conceito de capitalismo/globalização e daqueles que, sob a alçada de um efeito hipnotizante, apenas pensam em lucro. Lucro esse onde a dignidade, os valores morais e a história familiar não podem ser obstáculos nas decisões tomadas perante papéis que determinarão o futuro de uma marca de vinhos.
Começando pela perspectiva daqueles que se encontram em vias de extinção, os pequenos produtores deram-nos a conhecer a razão porque produzem vinho.
Estes, proprietários de poucos hectares, dedicam-se a esta actividade como um artista dedica-se à sua. Aos olhos destas minorias, é uma actividade onde o sucesso só é obtido quando existe harmonia, quando o produtor entra em sintonia com o objecto. “ Para produzir vinho é preciso fazê-lo como um poeta, é preciso haver uma ligação espiritual com a terra”. Cada pequena parcela de terreno tem o seu próprio resultado final. Para explicar isto, um “terroir” que se encontra virado para onde o sol nasce dará uma uva com sabor diferente de aquele que se encontra virado para onde o sol se põe. Desta forma, para eles é incompreensível como o conceito de globalização esteja a ser inserido neste pequeno mundo.
Cada vindima é vivida com intensidade. O amor que foi transmitido a cada raiz, o cansaço de tanto suor escorrido nos campos, o transpor da própria personalidade para o sumo de cada uva é que será, para eles, o resultado de um bom vinho e por conseguinte o orgulho da sua marca.
Numa perspectiva oposta a esta, vem “o grande mundo”, o mundo capitalista, onde não há lugar para poemas ou poetas, para sentimentalismos. Este é constituído por multinacionais que querem produzir nos três continentes, mesmo que a tradição não seja essa. Para estes produtores o importante não é através das suas terras produzir um vinho com características únicas. Aqui deixa de existir o conceito de qualidade que rapidamente é ultrapassado pelo de quantidade. As marcas vão além fronteiras e dependentemente de o vinho ser produzido na América do Sul, na Ásia, nos E.U.A ou na Europa o rótulo será sempre o mesmo. Vinhos que não passam de um resultado plastificado, onde o paladar e aroma são criados em laboratórios e não através da cultura praticada à muitos anos atrás.
Portanto, recomendo o filme a quem ainda tem dúvidas sobre a realidade onde se insere. Não vale a pena distorcê-la porque está mesmo dividida em dois pólos longínquos um do outro.
Eu prefiro o método tradicional onde os valores morais estão acima de tudo, onde a humildade é um facto e onde o resultado final traduz-se em toda a dedicação aplicada a qualquer actividade. Outros com certeza que terão como preferência o lado plastificado, em que a dignidade é uma utopia. Aqui tudo é superficial – Será isso relevante? - A vontade de lutar contra isso já é pouca.
B.M.

terça-feira, maio 17, 2005

La Bella Società

No outro dia estava a conduzir o meu Ferrari 560 Testagrossa e deparei-me com uma indagação deveras questionável. E ainda me pergunto sobre essa indagação, na medida em que qual será a nossa missão neste mundo?

Será que a vida estipulada pela nossa sociedade é mesmo assim que deve ser vivida? Ou seja, será que devemos estudar, tirar um curso, conhecer uma rapariga, casar com ela, ter filhos, ser avô e mimar os netos? Sendo que os nossos filhos fazem o mesmo caminho que nós.

A meu ver não! Eu penso que nos devemos amotinar contra esta sociedade que nos restringe, que nos prende, que nos impede de sermos nós próprios, de extravasarmos os nossos reais sentimentos e sensações, afinal de contas quem quer ser mais uma formiga trabalhadora? Presa a toda a corrupção presente no mundo, confinada a mexer apenas com o que é ordenada? Sempre a trabalhar para as formigas rainhas que são os chefes capitalistas que a mim apenas me metem nojo por se aproveitarem do trabalho alheio, do suor de outrem.

Não é difícil mudar esta situação, basta que haja uma consciencialização por parte da massa populacional em geral, não é preciso haver líderes, porquê que as pessoas não podem pensar por elas mesmas e serem o que elas mesmas querem sem recorrerem a ordens de pessoas que possivelmente não têm nenhuma ligação com o assunto!

“Pessoas oprimidas não podem permanecer oprimidas para sempre” Martin Luther King.

L.M.

Something about Football

Um artigo acerca de futebol que não cai no ridículo hoje em dia é quase uma missão impossivel. Críticas a arbitragens, a sistemas, a jogadores e treinadores são uma constante nos jornais especializados na matéria.
Este texto visa, não falar sobre árbitros ou sistemas, mas sim sobre a emoção e entusiasmo que o futebol faz sentir naqueles que o vivem com intensidade e fervor. Pessoalmente sou um grande adepto do desporto em geral e do futebol em particular, não nego mesmo que choro, vibro, riu, etc., com os resultados da minha equipa.
O futebol é um dos traços mais característicos da nossa cultura, bem como o fado, e embora haja quem goste e quem não goste, temos de admitir que hoje em dia é o futebol que mais exalta o nome de Portugal em todo o mundo. Basta irmos ao estrangeiro e dizer que vimos de Portugal para automaticamente ouvirmos : Figo, Ronaldo, Deco ou mesmo o longínquo Eusébio.
No fim-de-semana passado, o jogo entre o Benfica e o Sporting fez parar o País, assim como o jogo entre o Sporting e o CSKA irá igualmente fazer. Nesses momentos sentimos toda a ansiedade, toda a alegria, toda a tristeza que se pode imaginar. Não sejamos mesmo hipócritas e admitamos sem medo nenhum que numa altura em que o País está de rastos é o futebol que dá alguma alegria e esperança à nossa população.
Resta me desejar que o Sporting ganhe a Taça Uefa, que o Benfica seja mesmo campeão e que o futebol não se degrade e continue a ser o nosso ópio, o verdadeiro ópio do Povo.

P.R.

Bloguices

O que é escrever? Não me referindo ao acto de pegar numa caneta e começar a sujar o papel com tinta, eu questiono-me acerca do que poderá eventualmente ser o acto de escrever.

A escrita implica processos mentais que não importa referir mas sim a sua intenção, ou seja, a meu ver o objectivo de escrever é a libertação de um constante fluxo de energias e partilha de informação para com outrém, com o propósito de atingir uma pessoa de forma a saber que marcamos a diferença. Neste momento posso afirmar que estou sob o efeito de elementos psico – activos que fazem com que esse fluxo transborde de forma anormal.

Eu aceitei este convite de forma a tentar deixar a minha marca em alguém, contudo duvido que o consiga, visto que acho que apenas alguém no mesmo estado de espírito que eu conseguirá sequer perceber o que está aqui escrito. Tento neste blog não recorrer a temas já propostos anteriormente, como o futebol, musica e politica, e isso resta-me com pouca coisa para escrever sem ser uma critica à nação que eu amo e vejo cada mais na ruína (sim sou bastante patriota, infelizmente), ou então como um amigo meu diria: “deslizar na maionese”

A maionese tem uma essência bastante estranha, na medida em que busca varias coisas ao mesmo tempo e temos de ter cuidado para quando deslizamos nela não nos deixarmos absorver completamente pelo descalabro ao qual ela nos pode levar e, neste momento, é o que penso que me estará a acontecer, no entanto (Bloqueio mental, é algo que acontece a qualquer um que desliza na maionese e se deixa levar).

Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar.” Bernardo Soares.

L.M.

segunda-feira, maio 16, 2005

Captura de Saddam

Este é o ultimo texto que estava pendente para colocar no Desvio do Pensamento. Foi escrito na mesma altura que o anterior e com a sua "publicação" no nosso blog ficam realizadas as minhas ambições de colocar ambos os textos neste nosso projecto.

“A Prenda de Natal”

No passado dia 14 de Dezembro caiu directamente no sapatinho da Administração Bush a prenda que à muito tempo esperavam: a captura do ditador iraquiano Saddam Hussein.
Podemos mesmo dizer que este ano o Pai Natal esteve em grande para os lados dos norte-americanos e devido a isso George W. Bush tem praticamente segura a sua reeleição como Presidente da maior potência do mundo.
A captura de Saddam Hussein, que durante 30 anos governou o Iraque (20 deles com o apoio dos EUA), veio trazer ao mundo Ocidental a ideia de que a partir de agora todos os problemas de segurança ligados ao mundo árabe e ao Iraque em particular serão resolvidos.
Saddam Hussein foi na realidade um tirano, um ditador, um déspota, uma quantidade infinita de barbaridades que nos possam ocorrer, mas a verdade é que nenhum ser – humano merece ser humilhado da forma como Saddam o foi, humilhação ocorrida aos olhos do seu povo e de todo a comunidade internacional e que curiosamente lhe foi “oferecida” pelos defensores do mundo que constantemente apregoam a paz e se afirmavam como os principais respeitadores dos direitos humanos.
Curioso será constatar através de uma análise minuciosa ao passado do “mito Saddam” que os principais culpados da situação ter chegado onde chegou são os EUA que durante 20 anos o tiveram a seu lado e se serviram dele para derrubar políticos que tivessem ideias discordantes das suas e simultaneamente terem no poder de uma das maiores potências petrolíferas e um dos mais importantes países árabes um homem da sua confiança.
Pois bem, o impensável aconteceu: o “menino” Saddam rompeu todos os acordos com os norte-americanos e partiu para a conquista de todo o mundo árabe que ainda hoje se sente dividido em renunciar às relíquias dadas pelos EUA e defender afincadamente os seus interesses, ou caírem na tentação de se juntar aos norte-americanos e beneficiar de todas as “prendinhas” que estes lhes possam oferecer.
É no entanto errado pensar que a situação no Iraque vai mudar com a saída de Saddam e os dados falam por si: há muito mais vitimas norte-americanas e do exército aliado desde que terminou a guerra do que quando esta estava a decorrer.
No entanto a captura de Saddam é um bem mais valioso, somente urge perguntar: Seria só Saddam a ter de pagar por tudo o que fez ao mundo e ao Iraque em particular…?
P.R.

Morte de Yassin

Este texto é de Março de 2004 e retrata o meu sentimento acerca da morte do xeque Yassin, o líder espiritual do Hamas. Desculpem o facto de não ser um artigo actual mas eu prometi a mim mesmo que um dia ia publicar isto no Desvio do Pensamento...

Dia 22 de Março o mundo acorda em sobressalto com a morte do xeque Yassin, o mítico líder espiritual do grupo islâmico Hamas.
Como se não bastasse já o mau clima que se vive no Médio Oriente com um azedar cada vez maior das relações entre Israel e a Palestina, os israelitas ainda se lembraram de meter mais uma grande acha numa fogueira que parece que tão cedo não vai parar de arder.
O mais preocupante, no entanto, surge quando ouvimos o primeiro-ministro israelita, Ariel Sharon, congratulando os militares israelitas por terem morto o “Bin Laden do Médio Oriente”.
Ora surge a questão: Quem é o verdadeiro Bin Laden do Médio Oriente? Seria mesmo o xeque Yassin, que se encontrava num estado de saúde mais que deplorável e que representava mais um símbolo do Hamas do que propriamente um guerrilheiro ou o cérebro de todo a organização?
Será Yasser Arafat que é considerado por grande parte do mundo Ocidental como um homem pacifista que privilegia o diálogo em detrimento dos confrontos armados (embora por vezes não lhes consiga pôr cobro, como é o próprio caso do Hamas) e que já deu várias provas de que não é coadjuvante com os actos terroristas por parte de alguns Palestinianos?
Ou será que é do Estado de Israel que não se contentando com a sua parte do território e com tudo o resto que ao longo da história tem feito ao povo palestiniano continua a querer subjugar o povo da Palestina às suas próprias regras impondo as mesmas na base de uma superioridade ao nível do armamento e da força militar tendo como pano de fundo a ajuda dos EUA?
É óbvio que com este tipo de discurso não se pretende desculpabilizar os palestinianos por todos os danos que já causaram no povo israelita, mas se compararmos as vitimas quer de um lado, quer de outro, facilmente concluímos que a diferença é abismal.
Para além disso, o povo palestiniano não tem a capacidade de entrar no Estado de Israel e disparar sob quem quer que seja somente com a finalidade de encontrar e matar os mais altos dirigentes políticos de Israel, ao contrário do que acontece do outro lado.
No nosso mais íntimo bastaria sentarmo-nos calmamente no nosso sofá (coisa que na Palestina já quase que nem se sonha) e reflectir sobre como nos sentiríamos se víssemos o nosso território ser invadido, a nossa cultura ser subjugada, os nossos amigos partirem, o medo dentro de nós aumentar a cada dia que passa, os nossos filhos morrerem aos nossos braços e toda a nossa vida mudar aos olhos de uma comunidade internacional que se mostra permissiva e cúmplice de tudo aquilo que é feito contra nós. A resposta está no interior de cada um de nós mas não parece difícil adivinhar qual é…
Para concluir resta esperar pela retaliação dos palestinianos, feridos no seu orgulho e com muita vontade de vingar o “eterno” líder espiritual do grupo Hamas… Ainda se fala em III Guerra Mundial e eu pergunto: Ainda querem uma pior que esta?

P.R.

O Início

Antes de mais quero saudar todos os que estão a embarcar nesta aventura que é o Desvio do Pensamento. Este Desvio é acima de tudo o projecto de alguns amigos que numa tarde de sol, numa mesa de um café tiveram a ideia de iniciar algo no qual pudessem pôr em prática tudo aquilo que aprendem no curso e assim começar a desenvolver a sua aprendizagem do jornalismo.
Este projecto é igualmente a mostra de que temos que ser nós a ter a iniciativa para criar coisas novas, já que no meio em que estamos inseridos (meio escolar) existem muitas iniciativas e projectos encantadores... é pena é que esses projectos nunca estejam relacionados com os alunos de Comunicação que são como os orfãos de um sistema que muitas vezes parece que nos despreza.
Depois de muitas indecisões e faltas de tempo cá estamos nós, todos juntos e prontos a atacar este Desvio do Pensamento que estou em crer, ainda vai dar muito k falar...
Quanto à minha participação pessoal, os primeiros textos que vou mandar para o nosso blog foram escritos à cerca de 1 ano atràs numa altura em que o mundo estava (e será que já não está...?) de pernas para o ar.
Camaradas, vamos em frente porque finalmente o Desvio está ai!!!
P.R.

sábado, maio 14, 2005

Ensaio

Quero ser livre.
Deixem-me ser livre! Ora, deixassem-me ser livre!
Já não sinto o que sinto que sentia,
e o que senti, já me esqueci, e perdi, nas horas obscuras.
Deixaram-me entregue ao relento,
e o relento abandonou-me naquela praia bonita,
ao lado da vida,
como quem vai para a morte.
O meu coração é um apartamento de luxo com vista para a solidão,
onde os pensamentos pairam em torno de uma estranha fantasia,
de um infinito credível,
eu, que em nada acredito, que em nada sou credível,
que me sinto mais vivo além...do que aqui neste tempo e espaço.
Mesmo não sabendo o que é isto ou aquilo,
mesmo nada conhecendo por inteiro - porque de inteiro nada tenho -
mesmo sabendo que sou aquele que podia ter sido e nunca foi...
ah! Quero ser livre!
Trabalhar é uma canseira e amar dói.
Ter horários humilha, as horas doem na alma,
como uma traição no amor perfeito.
Minh'alma chora por liberdade, ela grita pelo analgésico da vida!
Quero ser livre, enfim, perdido..
Porque a liberdade não se conquista nem com trabalho nem com amor.
Ela vem, bela e elegante, por entre as palavras e a música pura,
ela está nas viagens feitas ao acaso, pela estrada fora,
ela vem por estranhos e ocultos caminhos,
a liberdade é companheira de Diónisos, e assim,
proibida...

F.A.R.

quinta-feira, maio 12, 2005

Descansa em paz Jorge!

A melhor forma de começar a minha conta de comentários aqui é fazendo uma homenagem a uma pessoa que nos deixou na noite de sexta passada. Perdeu-se uma pessoa apaixonada pelo futebol, pelas pessoas e pela vida, um Homem que vai deixar muitas saudades entre todos nós.

Tenho a certeza disso, porque eras do Benfica e amaste o Sporting, porque eras meu primo e outras famílias houve que choraram por ti e porque até no momento do Até Sempre brindaste-nos com uma brincadeira que nos comoveu com um sorriso nos lábios. Sabias que o teu coração estava cada vez mais frágil e pediste que tocassem musica angola no teu funeral, a musica que corre no sangue da nossa família e com a qual cresceste ao lado das pessoas que a ouviram ontem de manhã. Pediste alegria e boa disposição na tua despedida,querias as pessoas alegres como sempre foste e sempre serás. E dançaste, como disse o Pêpê à tua mulher quando ela lavada em lágrimas ouviu da boca do filho de 15 anos: "Não chores mamã,o pai tá a dançar lá em cima..."

É essa a imagem que vou guardar de ti primo, a de alguém que viveu para fazer os outros rir e que foi sempre único, em tudo o que fazia.

Descansa em paz Campeão.
R.C.

quarta-feira, maio 11, 2005

What about listening to jazz?

Talvez seja melhor começar com um início decente.

O meu primeiro impacto com o mundo do jazz foi com a música “Why Don’t You Do Right?” tocada pelo swinger Benny Goodman e cantada pela voz de Peggy Lee. É simplesmente fenomenal e singular – a voz dela extremamente doce a juntar-se em pleno ao suave clarinete de Benny Goodman – é de notar o pequeno solo quase cliché que sai daquele clarinete –; faz-me lembrar aqueles sons que ouvimos e que inconscientemente cantamos sem saber bem de onde vêm, mas que quando finalmente ouvimos, é quase como um alívio sabermos a sua proveniência. Era este som que me atormentava, mas descobri-o… e adorei-o… há já algum tempo.

Depois deste inocente e repentino encontro com a música jazz, não me lembro de me esforçar por ouvi-la senão de manhã no magnífico programa dos “cinco minutos de jazz” do José Duarte, na rádio. Era quase como uma salvação. Acordar em stress, despachar-me em stress, entrar no carro da minha mãe em stress e finalmente esperar pela selecção matinal de jazz que este senhor fazia (e faz) como ninguém – «passa o genérico, explica minuciosamente em poucos segundos quem vai tocar, e: música… – até atingirmos o ponto de rezarmos por chegar o dia em que temos uma cultura jazzística igual ou superior a este senhor.

Mas foi realmente aos 17 anos que decidi abrir uma pequenina porta desse colossal mundo do jazz, começando então por ouvir algumas coisas de Miles Davis, Duke Ellington, Louis Armstrong e John Coltrane. O momento marcadamente simbólico para mim foi o dia em que “desencantei” um Live in Bologna 1985, já com algum pó, de um tal Chet Baker. Foi aí que realmente comecei a apreciar a música jazz, tendo por base este CD que ainda hoje o guardo com extremo cuidado e segurança, visto ser uma raridade exemplar que me dá sempre um imenso prazer ouvir, seja onde for, a qualquer altura.

Vindo parar a mim doutras partes que não o jazz, Keith Jarrett com os seus The Köln Concert e La Scala, de tão magníficas obras que o são, despertaram-me o interesse de explorar a obra deste pianista, o que levou-me a ouvir de “rajada” o seu trio com Jack deJohnnette e Gary Peacock, com as inigualáveis prestações nos concertos Standards gravados no Japão. Noutras perspectivas da música jazz, Zakir Hussain igualmente me ilustrou bem os seus brutais dotes musicais perante um par de “tablas” – principalmente com Jan Garbarek, John McLaughlin e Hariprasad Chaurasia em Making Music.

De um jazz talvez clássico – não no sentido “morto” e retrógrado desta palavra, mas sim no sentido de lembrar a instrumentalização que esteve na origem e no desenvolvimento da evolução do jazz – até um jazz de fusão electrónica (sendo, por base, a corrente fusion, com as mãos da electrónica). É neste campo que me dediquei mais tempo (e continuo a dedicar), sendo para mim altamente excitante a fabulosa mistura dos ritmos jazz e dos seus instrumentos com uma certa improvisação, por parte do(s) DJ(s), de batidas e misturas, que fazem do jazz algo altivo no campo electrónico. Uma corrente altamente inspiradora que começou com o nome de acid-jazz pelas mesas da dupla austríaca Kruder & Dorfmeister e que evoluiu para muitas formas de encarar esta junção. Acid-jazz, nu-jazz, electro-jazz, alguns nomes que definem, de certa forma, uma mesma corrente.

Espero que o mundo do jazz em geral continue como sempre o vi: uma gigantesca árvore genealógica com um desmedido número de ramificações de géneros e estilos – alguns ramos já estagnados e outros sempre a crescer.
J.A.